sábado, 19 de novembro de 2011

Kaidan (1964)


Quando pensamos em J-Horror, a nossa memória cinéfila remete-nos, quase imediatamente, para espectros de cabelos compridos, olhos ebúrneos e hábeis em assombrar os mais diversos meios de tecnologia moderna. Poderá, assim, ser estranho para alguns encarar KAIDAN como obra seminal do género, sobretudo se atentarmos ao facto de que o filme bebe inspiração em quatro lendas do folclore medieval nipónico, pejadas de simbolismo moral e/ou romântico e sem um único jump scare para a conta…
No entanto, e ao longo da visualização de KAIDAN (ou “histórias de fantasmas”, em japonês), quase todos os títulos que associamos ao cinema de terror moderno oriundo do país do Sol Nascente serão invocados — atrevo-me mesmo a dizer, a génese de RINGU (1998, Hideo Nakata) ou JU-ON (2002, Takashi Shimizu) nasceu por intermédio de Masaki Kobayashi.


KAIDAN é mais prolífero na criação da atmosfera sobrenatural do que em perturbar o espectador pelo susto surpresa. Em todas as suas quatro histórias — linearmente intituladas como «The Black Hair», «The Woman of the Snow», «Hoichi, the Earless» e «In a Cup of Tea» —, e através do seu magnífico trabalho visual expressionista, somos testemunhas dos pesadelos mais bucólicos que a Sétima Arte já ofereceu, plenos de estilização cenográfica, arrojados esquemas cromáticos e lânguida direcção de fotografia, apta a conferir vida às histórias de batalhas navais representadas nos painéis “e-maki”.
Mas é na concepção subtil do terror das suas narrativas que KAIDAN, realmente, se distingue. Preenchido por temas como o tumulto interior causado por anos de remorsos e sentimentos de culpa, as consequências da sedução descomprometida, a assombração incauta e a negação do próprio irreal, não é difícil catalogá-lo como um portento de horror espiritual e psicológico, absolutamente inspirador para cineastas (ou não) dedicados ao género e totalmente inesquecível.



Samuel Andrade (Keyzer Soze's Place)

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