sábado, 28 de janeiro de 2012

Dellamorte Dellamore (1994)


Após a minha desistência do curso de Comunicação Social, tive a sorte de viver quatro anos em Boston, no estado de Massachusetts, para onde fui estudar o que realmente queria. O trabalho era árduo, mas eu descobri a minha salvação numa secção de DVD´s da Tower Records chamada Midnight Movies - nesta secção, descobri todos os clássicos da série B (ou série C!). Filmes eróticos do Ed Wood, lésbicas na prisão, o catálogo da Troma. Foi aqui também que descobri a minha paixão por filmes de zombies e pelo terror italiano: Fulci, Bava, Argento. Entre estes filmes descobri um filme chamado Cemetery Man, originalmente Dellamorte Dellamore, e é uma adaptação livre de um famoso fumetti italiano chamado Dylan Dog. Quando vi a capa, claramente camp, pensei que seria "mais um". Mais um entre outras centenas de filmes de zombies, daqueles que rapidamente desaparecem da memória. Não é. É um filme especial: é um filme muito especial.


Não há milagres - Michele Soavi fora assistente de realização do supra-citado Terry Gilliam no maravilhoso filme The Adventures of Baron Munchausen (1988), outro filme incompreendido de Gilliam, que foi um verdadeiro desastre de bilheteira.

A realização de Dellamorte Dellamore mostra uma sensibilidade especial - é um tratado sobre o amor, sobre a amizade, sobre a traição, sobre a morte. As influências do realizador são várias - vemos o surrealismo de Gilliam, vemos os mestres do novo cinema de terror italiano, vemos a composição de René Magritte (de realçar a sequência baseada no quadro Os Amantes). Sim. Este filme não é um cachimbo. É bem mais do que isso - embora disfarçado de um filme de zombies, este filme é, sem dúvida alguma, um poema visual e um testemunho profundo sobre importantes questões existenciais.


"This film was not a horror film. This film was about the fear of life."

Michele Soavi - 2010 interview



Infelizmente, pouco mais se ouviu falar deste brilhante realizador. Retirou-se pouco após este filme para tratar do seu filho, que viria a falecer de uma doença crónica. Embora tenha recentemente retomado a sua carreira de realizador, vi, neste seu filme, algo que não se encontra com frequência: verdadeira generalidade.

Para concluir, digo que este filme serviu de motivação para fazer uma interrupção na minha vida de músico e abraçar um projecto cinematográfico - a minha primeira curta-metragem, "I´ll see you in my dreams", foi uma homenagem directa a este filme. O facto de o título ser uma canção tem directamente a ver com Brazil, em que uma canção sumariza a ideia principal do filme.


Filipe Melo (Dog Mendonça e Pizzaboy)

quinta-feira, 19 de janeiro de 2012

Dreams (1990)


Lembro-me de onde e quando vi este filme pela primeira vez. Em Lisboa existe um Centro Comercial que tinha um cinema, o Apolo 70. Vi-o aí, na companhia da minha mãe, numa das inúmeras vezes em que nos metíamos num cinema sem saber o que nos esperava. Sem querer estar armado em esperto, creio que ainda hoje acho que este não é filme para um pré-adolescente, mas aconteceu, e ainda bem que aconteceu, porque o adorei desde o primeiro dia; e o único filme japonês que até então conhecia era o Godzilla.

Este filme é baseado nos próprios sonhos de Akira Kurosawa, e é dividido em vários capítulos ou segmentos independentes. O que me surpreende é a forma como um filme muito mais visual do que narrativo conseguiu permanecer durante tantos anos na minha memória - e eu tinha uma mente pouco adulta, habituada ao História Interminável, ao Conan o Bárbaro e aos filmes do Van Damme. Ainda hoje me pergunto como é que este filme conseguiu, de facto, marcar-me da forma como marcou. Este filme é, de alguma forma, uma espécie de biografia do inconsciente do seu realizador.


Como nos filmes acima referidos, é muito difícil falar sobre um objecto artístico que se baseia fortemente na abstracção - a memória torna-se sensorial e emocional, e qualquer discussão sobre os aspectos técnicos ou narrativos torna-se completamente secundária e irrelevante.

O que une estas três obras é essa abstracção: a fusão entre o fascinante mundo dos sonhos e o cinzento mundo real. Motivam-nos a misturá-los cada vez mais nas nossas próprias vidas, e a não esquecermos aquilo que sempre fomos, desde as mais remotas memórias que temos até àquilo que somos hoje, enquanto adultos.


Filipe Melo (Dog Mendonça e Pizzaboy)

terça-feira, 10 de janeiro de 2012

Brazil (1985)


Vi este filme pela primeira vez no princípio dos anos 90, sem saber quem era o Terry Gilliam, apesar de, pelas noites da RTP, conhecer bem os Monty Python. Aluguei-o, como a muitos outros, no videoclube do Centro Comercial Fonte Nova, especialmente por duas razões: a primeira foi o Robert de Niro, que na altura tinha pelos cinemas um filme de que gosto muito chamado Midnight Run (1988). A segunda razão foi o Bob Hoskins, de quem eu era fã por causa do Who Framed Roger Rabbit?, filme do mesmo ano.


Nada me poderia preparar para a experiência que se seguiu. Eu estava à espera de um filme normal. O que se seguiu foi, no entanto, uma experiência muito especial. Brazil é um filme que consegue algo verdadeiramente difícil - conciliar um orçamento gigante com uma história surrealista, pessoal e extremamente perturbadora. O final deste filme(acompanhado pela alegre canção de Ary Barroso - Aguarela do Brasil) continua a ser, a meu ver, um dos momentos mais desesperantes e aterrorizadores da história do Cinema. Porém, existe um contraste muito grande entre o mundo horrível em que o protagonista vive e o mundo imaginário que o liberta da realidade controladora e burocrática do seu dia-a-dia. À medida que o filme avança, o mundo de sonhos de Sam Lowry (Jonathan Pryce) vai-se misturando com o mundo cinzento que o cerca, gerando uma espiral em que nós, como meros espectadores, nos vamos envolvendo e da qual não sairemos durante muito tempo - literalmente enlouquecemos com a personagem.


"I actually design [a film] so that, I hope, people will go back and see it again and again. I find that most films are a little bit like fast food. I mean you have them and it's fine and it's over and done with and that's the end of it. And I like the idea of going back and rediscovering, or discovering new things all the time."


- Gilliam, 1986 Interview



A narrativa do filme é relativamente linear, porém, a forma como é contada faz com que seja um filme extremamente original. Não irei contar-vos a história - é um filme que terão de ver, porque não há qualquer forma de utilizar palavras para o descrever. Este filme é, possivelmente, o melhor exemplo da mente visionária de Terry Gilliam, que continua a ser um dos poucos realizadores que consegue evitar cedências face à pressão dos grandes estúdios, o que também explica os gigantes problemas de produção que caracterizam todos os seus filmes. A complexidade de Brazil faz com que não seja só um filme. É uma viagem à imaginação e aos próprios sonhos do realizador.


Filipe Melo (Dog Mendonça e Pizzaboy)

segunda-feira, 2 de janeiro de 2012

Tertúlia de Cinema XI

Tema: Os Sonhos no Cinema



É sempre muito complicado para mim escrever sobre filmes, música (ou qualquer arte), especialmente se tentar escrever um texto mais emocional que técnico. Para esta tertúlia, decidi enfrentar o desafio de contrariar a minha tendência natural para preparar tudo e decidi apenas escrever, sem revisão, sem preocupações e, acima de tudo, sem pretensões. São filmes de que gostei muito e com os quais tenho uma relação emotiva muito forte. Acredito que, de uma forma pouco óbvia, estão intimamente relacionados.




1º Brazil (1985)



Realizador: Terry Gilliam
Ficha Técnica no imdb


Trailer:



A ter início em 10 de Janeiro de 2012








2º Dreams (1990)



Realizador: Akira Kurosawa
Ficha Técnica no imdb


Trailer:


ver aqui.


A ter início em 19 de Janeiro de 2012







3º Dellamorte Dellamore (1994)





Realizador: Michele Soavi
Ficha Técnica no imdb



Trailer:



A ter início em 28 de Janeiro de 2012





Tertúlia planeada por Filipe Melo (Dog Mendonça e Pizzaboy)