quarta-feira, 28 de dezembro de 2011

Il Grande Silenzio (1968)


O western spaguetti existia há uns anos, o Leone tinha feito uns quantos, como o Sollima, o Fulci, o Damiani e o próprio Corbucci. E se são todos estimulantes - e digo ao mesmo nível, porque não acho os do Leone superiores em medida alguma - a verdade é que o "petardo" e a singularidade de Il Grande Silenzio não se podiam prever..

Os "floreados" históricos são esquecidos - entenda-se o "romanceamento" da coisa, dos pistoleiros, das situações - e dão lugar a uma brutalidade sem concessões - que era para o que o desencantamento no olhar do oeste de cineastas tão diferentes como Mann, Boetticher e Ford, apontava - que toma forma pela frieza da paisagem e pelos personagens brutos e cínicos que a povoam..

A trama e o cenário até podem fazer lembrar Day of the Outlaw de Andre de Toth, filme fabuloso e algo secreto, mas De Toth não foi longe o suficiente (e quão longe ele foi), não podia.. Se De Toth é melhor cineasta que Corbucci, não sei, quer-me parecer que sim, mas o que de mais virtuoso e veloz existe na câmara do italiano - algo gritante e maneirista, vide Django e Navajo Joe - aqui é contidíssimo e dá lugar a uma coisa mais fluída, como que acompanhando o compasso lento da belíssima banda-sonora de Ennio Morricone.


É provável até que Morricone tenha feito a música antes das rodagens e que a contenção de câmara se deva a isso, como o silêncio e a mudez de Silenzio se devem à vergonha de Jean-Louis Trintignant, actor de Bertolucci, Lelouch, Rohmer, em participar neste tipo de filmes. Verdade é que tudo funciona, às vezes as restrições a que um cineasta é sujeito ajudam-no imenso artisticamente..

(spoilers)

O nome do filme é o nome da personagem do actor francês, mas o filme, esse, é todo de Klaus Kinski, e é uma meditação sobre quão serena e pensada é a aproximação do mal. Retenho o penúltimo plano e o olhar pávido - lúcido, sem remorso algum - de Kinski, a contemplar o massacre e os cadáveres dos mórmons, empilhados como gado no bar, enquanto desaparece com o seu bando pela névoa branca daquela cidade do Utah e o epílogo histórico começa a aparecer ao som do tema de Ennio Morricone..

Peça de género de um lirismo arrebatador.. Obra-prima..



João Palhares (Cine Resort)

segunda-feira, 19 de dezembro de 2011

Bend of the River (1952)

Há uma cena neste filme toda construída para um plano pormenor duma roda de madeira a desencaixar da carroça, numa travessia. Conforme progride, a câmara capta a instabilidade do terreno e a iminência da catástrofe. Não me parece que a cena seja sintomática seja do que for, não é uma "tese", não é uma "marca", mas parece-me que todo o filme trabalha este conceito.

A primeira parte do filme constrói os contextos e relações que tem que construir para, perto dos 50 minutos, começar a explodir. Mas devagar. Quando James Stewart chega àquela cidade suja e corrupta.. O ouro muda a cidade e Stewart tem que roubar, pegar no que é dele, fazer uma travessia pelo rio e pelos montes até ao povoamento que espera os mantimentos do Inverno. Os mantimentos e a viagem estão sempre suspensas por um fio, sempre à beira do colapso e da catástrofe. Enquanto "nada" acontece, vemos: as pedras soltas, o céu azul, entraves para o percurso, não há poesia ambiental em Mann, a natureza assume um papel muito prático e destrutivo; as conspirações do grupo de mineiros para roubar os mantimentos, entre risos e conversas; e, sobretudo, a relação McLyntock-Cole (James Stewart e George Kennedy) a intensificar-se, progressivamente, até ao ponto de quebra: a terrível vingança de McLyntock.


É por estes parcos 25 minutos que tudo o resto ganha significado, são a consequência da pena de McLyntock por Cole e do salvamento da forca, no princípio do filme. Dois homens com o mesmo passado criminoso, dois homens que se compreendem, dois homens capazes do terrível. Por todas as diferenças de resultado ou intenções, a traição de Cole não é mais terrível que a caça ao homem de McLyntock. Só Mann filmar isto, assim, e com esta consciência, fá-lo dos dez melhores westerns dos anos 50. O embate nos rápidos é violentíssimo, e não há carga de porrada em filme, semelhante. Tudo montado para fazer perceber a força da água, bem como daqueles dois homens: veja-se quão rápido é levado Cole pela corrente logo que perde os sentidos, veja-se o apuro do que é fazer o espectador perceber tudo isso... que há forças e forças.. e contra algumas pode-se pouco..

Como todo o grande western, diz que há viagens que nos moldam, mas que a maior das viagens, para o bem ou para o mal, é no íntimo, no interior de cada Homem.. no saber se se está vivo ou morto.



João Palhares (Cine Resort)

quinta-feira, 8 de dezembro de 2011

Stars In My Crown (1950)

É-me muito difícil falar sobre este filme. Difícil porque acho impossível expor todo o assombramento e alegria que se me invadem sempre que o vejo. Como é que em menos de 90 minutos se chega a tanto? Se conta tanto? Se eleva cada personagem com uma delicadeza tão tocante? Como é que em quatro planos – e sem diálogos, na sequência da carroça de feno – se descreve antologicamente todas as infâncias?
Stars in My Crown é um western pelo período e pelo país em que decorre a acção. Sobre uma comunidade, sobre as bases sociais e educacionais dessa comunidade. Sobre a espiritualidade dos seus membros. É sobre tudo um bocado, por haver um interesse, uma vontade, de se fazer ver a complexidade pelo que é mais simples. Procurá-la pela contemplação. Sem dúvida alguma, um dos “essenciais da História do Cinema”, embora pouca gente o conheça.


Para terminar, dou a palavra a Jacques Tourneur, o realizador:

Nessa altura (1949), estava livre, e não tinha contrato com nenhuma firma. Tinha ganho bastante dinheiro com os filmes Berlin Express (1948) e Easy Living (1949). Tinha um grande amigo na MGM, o William Wright, que preparava um pequeno filme. Pedi-lhe para ler o argumento e ele emprestou-mo. Entusiasmei-me logo. Telefonei a Wright e disse-lhe que queria, custasse o que custasse, filmar esse argumento. Respondeu-me: 'Mas, Jacques, é um filme sem importância, com um orçamento reduzidíssimo, que tem que ser feito em doze dias, e a nossa ideia é contratar um realizador pago à semana'. Continuei a insistir e ele disse-me: 'Jacques, percebe-me, não te podemos pagar'. Respondi-lhe: 'Ouve, não há problemas, faço o filme de graça'. Esta resposta estarreceu-o e, no dia seguinte, mandou-me dizer que me pagaria o que estavam dispostos a pagar ao realizador contratado à semana. O que, de resto, acabou por se virar contra mim, porque, quando acabei o filme, e me propuseram outros, todos os estúdios iam logo perguntar à Mgm quanto é que me tinham pago e foi assim que o meu ordenado foi reduzido ehttp://www.blogger.com/img/blank.gifm dois terços. Foi o preço que paguei pela minha vontade de rodar este filme. O autor do romance, Joe David Brown, escreveu-me uma carta que guardei, em que me dizia que tinha ficado comovidíssimo ao ver o filme, que o achava bem melhor que o romance. E ainda hoje, quando o encontro, Joel Mcrea diz-me sempre: 'Jacques, a maior alegria de toda a minha carreira foi ter trabalhado em Stars in My Crown (1964).


João Palhares (Cine Resort)

quinta-feira, 1 de dezembro de 2011

Tertúlia de Cinema X

Tema: Os Outros Westerns



1º Stars in My Crown (1950)



Realizador: Jacques Tourneur
Ficha Técnica no imdb


Trailer:




A ter início em 8 de Dezembro de 2011




2º Bend of the River (1952)




Realizador: Anthony Mann
Ficha Técnica no imdb


Trailer:




A ter início em 19 de Dezembro de 2011




3º Il Grande Silenzio (1968)





Realizador: Sergio Corbucci
Ficha Técnica no imdb

Trailer:




A ter início em 28 de Dezembro de 2011




Tertúlia planeada por João Palhares (Cine Resort)