segunda-feira, 7 de fevereiro de 2011

They Live By Night


"Cinema is Nicholas Ray” - Godard sobre Nicholas Ray

They Live by Night foi um filme importantíssimo, na medida em que inspirou meio mundo. O cinema de hoje deve-lhe alguma coisa, os próprios jovens dos Cahiers lhe devem muito.
O seu cinema não seria o mesmo se não tivesse existido o autor americano. Pego no primeiro plano do filme, talvez numa das mais belas aberturas de sempre “This boy... and this girl... were never properly introduced to the world we live in... To tell their story...” Para logo surgir o título They Live by Night.”.
De uma mistura de pureza, inocência e felicidade para um carro em velocidade. Filmado de um helicópetero, a câmera aproxima-se vêem-se três indivíduos. Acabou-se a inocência, quando mais tarde vimos a saber que são três crimonosos em fuga.
They Live by Night é um filme vibrante, é um noir sim, mas é também um romance, ou um road movie. Sim, um dos mais belos road movies alguma vez feitos. Bowie é mais um dos rebeldes que Nicholas Ray trouxe para o grande ecrã que sofreu o seu expoente com James Dean em Rebel Without a Cause.
Bowie é um inadaptado, que procura o seu lugar no mundo. 23 anos, 7 deles passados atrás das grades. Uma capacidade de amar enorme, correspondido por Keechie. É curioso seguir o percurso de ambos. No incício tudo parece um retrato adolescente, para mais tarde perderem a inocência. Não existiria mais forma de escapar e o filme caminhava a paços largos para a tragédia final. Keechie não é a típica femme fatale dos noir. Mas é o único ponto que se distancia deste género. Temos um crime e a perspectiva é vista através dos actos dos criminosos. E uma das maiores qualidades do filme é explorar os dois personagens principais, a sua ligação, o seu contacto, troca de olhares e palavras. No final, temos um filme ambicioso, uma montra para o resto da carreira de Ray, e uma das melhores entradas no mundo do cinema. Um filme sobre coragem, esperança, e também sobre o amor. Amor jovem e inocente.

João Gonçalves / Voices of a Distant Star

10 comentários:

  1. "Eles vivem de noite" e realmente é mesmo assim. A história de Bowie e Keechie que como criminosos em fuga são obrigados a viver de noite e dormir de dia.

    Para mim foi um belo começo, tanto pelo tema como pelo filme em questão.

    Os ingredientes clássicos do noir estão cá. Temos um crime, a perspectiva do criminoso, temos a femme, não fatale no sentido a que normalmente a palavra está associada, pelo menos a típica femme fatale. Mas temos uma mulher, uma paixão que acaba por ser fatal para Bowie.

    Temos uma introdução nada comum nos dias de hoje, a imagem de dois amantes e umas curtas palavras sobre os dois. Logo aqui é ponto certo que as coisas não vão acabar bem para aqueles dois.

    Sabemos que Bowie está preso desde os 16 anos, não sabemos o que aconteceu, apenas que desde essa altura a prisão é tudo o que conhece. Agora com 23 anos decidiu fugir com a ajuda de mais dois. Há aqui um sentimento de dívida. Quando Bowie quer por exemplo parar de assaltar bancos porque prefere seguir outro rumo tem dificuldade em afastar-se deles não só por receio, mas porque existe esse tal sentimento de dívida, não fossem estes mesmos homens e Bowie estaria preso sem nada nem ninguém.

    Keechie conquista rapidamente Bowie com a sua inocência e genuinidade, aliás é mútuo, também Bowie é muito genuíno e inocente.
    Um belo amor, mas condenado.

    Pensava que as coisas iam terminar quando decidem ir jantar fora. Normalmente é sempre um capricho deste género, o tentar pelo menos uma vez fingir que se tem uma vida normal. Mas não, há perigo mas surpreendentemente Bowie não tem problemas de maior.

    No final são obrigados a pedir ajuda, pois Keechie que está grávida encontra-se doente. Tudo correria bem se não fossem traídos.
    Fiquei com a sensação que o próprio marido da mulher que os traiu olhou desiludido para a esposa (tenho de rever) o que faz sentido, os criminosos têm um código e ninguém gosta de bufos.

    A troca de olhares final entre Bowie e Keechie resume tudo. Uma bonita mas trágica história de amor.

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  2. Eram outros tempos, Bowie nos dias de hoje não tinha sido condenado a prisão perpétua aos 16 anos. Aliás no próprio filme a lei já muda em relação à idade e o protagonista tem planos para ir a um advogado e tentar ver-se livre da pena.

    A lei muda para os que estão cá fora, mas os que estão dentro continuam na mesma situação.

    Esqueci-me de salientar as palavras do policia no fim. Sobre o sistema não ajudar na reabilitação e no fundo só contribuírem para que não ocorra.

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  3. Desde que li essa citação que escreveste no início em The Dreamers, nunca mais que esqueci.

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  4. Grande filme e grande estreia de Nicholas Ray

    Filhos da Noite, de Nicholas Ray (1949)

    No ano em que Nicholas Ray se sentou na cadeira de realizador pela primeira vez deu-nos nem mais, nem menos, do que três filmes. O IMDB refere um quarto onde o cineasta não surge nos créditos. É obra. Um deles foi precisamente «Filhos da Noite», a história de Bowie (Farley Granger), um jovem que escapa da prisão com dois criminosos mais velhos: Chickamaw (Howard Da Silva) e T-Dub (Jay C. Flippen). Durante a fuga o trio procura refúgio na casa do irmão de Chickamaw e Bowie acaba por travar conhecimento com a sobrinha deste, Keechie (Cathy O’Donnell) por quem se apaixona.

    Depois de um assalto bem sucedido o grupo de criminosos desfaz-se e o casal parte também em fuga. Durante esta fuga os dois jovens casam-se e dá-se o encontro com uma das personagens mais intrigantes de «Filhos da Noite» e ao mesmo tempo uma que irá voltar a ter um papel fundamental no final do filme: Mr. Hawkins (Ian Wolfe), o homem que os casa faz tudo por dinheiro e admite ser também um ladrão, mas quando Bowie realmente precisa, não o ajuda. Depois do casamento à pressa, o par volta a ser assolado pelos fantasmas do passado quando Chickamaw regressa para propor ao jovem um novo golpe.

    O amor de Bowie por Keechie é posto à prova nesta altura, quando tem de escolher entre a paixão pela esposa e a amizade pelos dois criminosos que o ajudaram a escapar da prisão. E o filme, já de si pouco esperançoso para o par, começa a ganhar contornos mais sombrios.

    «Filhos da Noite» é um belo filme. Consegue ser uma bela história de amor, entre dois jovens que têm uma vida inteira pela frente, mas que não podem seguir os seus sonhos devido ao passado de Bowie, e ao mesmo tempo um filme sobre os dilemas de um pequeno criminoso que tenta tudo para escapar ao destino, mas que por uma razão ou outra não consegue.

    As interpretações estão muito boas, sobretudo as do jovem casal que tem uma excelente química e a de Chickamaw, com o seu olho de vidro, que é um grande papel. «Filhos da Noite» não poderia ser uma melhor estreia de Nick Ray em tons de Noir.

    Nota: 4/5

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  5. Foi paixao à primeira vista. Bowie e Kitchee. Ray e Thieves Like Us, o nome do livro de 1941 que se tornaria num dos filmes icónicos da série B americana. Com outro titulo, mais sugestivo e, ainda hoje, mais tragicamente shakesperiano.

    A morte é o único elemento que paira sobre They Live by Night a cada frame. É algo que podemos antecipar, como um sentimento amargo que sentimos a morder-nos as entranhas. Bowie e Kitchee não tinham o espirito rebelde de Bonnie and Clyde. Foram productos do seu tempo, uma era de incertezas onde as oportunidades surgiam a conta-gotas e, quase sempre, com um preço demasiado caro às costas. Para estes jovens fugitivos, estes ladrões com alma – a sua, pelo menos – a vida nunca lhes ofereceu outra oportunidade para darem a outra face. Bowie – que significou o inicio da prometedora carreira de Farley Granger que não duraria muito – conhecia melhor a vida atrás das grades do que fora. Esse cinzentismo visual, que a fotografia a preto e branco capta à perfeição, só se desvanece quando o plano se cruza com o resto de Kitchee – Cathy O´Donnell, outra promessa por confirmar – a virginal e inocente alma que se cruza no seu caminho depois de um assalto bem sucedido e uma fuga trepidante. Bowie sabe o que quer da vida. Mas também já viveu suficiente para saber que a vida é que não quer nada com ele. Por isso arrisca, joga tudo numa cartada que todos sabiamos que seria, inevitavelmente, um doloroso bluff.

    Tal como a vida de Bowie, também a gestação desta obra inaugural da carreira de um dos cineastas malditos de Hollywood, viveu os seus sobressaltos. A RKO comprou os direitos do livro de Edward Anderson em 1941 mas só seis anos depois é que foi dada a autorização a Ray para fazer deste o seu primeiro projecto pessoal. A rodagem foi curta, a edição também mas They Live by Night ficou dois largos anos na prateleira e estreou-se numa sala inglesa em 1949. O sucesso junto da critica europeia, a afiar adagas para o que se veria nos anos seguintes, particularmente nas revistas temáticas francesas, levou o filme a chegar às salas americanas onde passou sem pena nem glória. Mas Ray, homem de mil e um mistérios, tinha feito já um nome na praça e preparava-se para um projecto mais ambicioso, com uma verdadeira estrela, In a Lonely Place.
    Na perspectiva de um cineasta que redefiniu o noir americano – depois do boom de 1941 – They Live by Night é um melodrama juvenil com um pano de fundo trabalhado para explorar o lado mais negro do periodo da Grande Depressão. A poesia no olhar enamorado dos jovens amantes ganha força suplementar quando Keechie, grávida e recém-casada, é forçada a seguir em frente na sua luta diária, só e apenas com uns breves momentos de felicidade como recordações ingénuas de uma vida que podia ter sido mas nunca o foi. Nesse sentido, a obra inaugural de Nic Ray é também um resumo certeiro da sua filosofia como cineasta, dessas vidas por cumprir, como as de Crawford/Hayden em Johnny Guittar, Bogart/Grahame em In a Lonely Place, Fontaine/Ryan em Born to be Bad ou o inevitável duo Dean/Wood no filme que melhor capta essa sequência emocional, Rebel Without a Cause.

    Ray, cineasta que soube, como poucos, captar o silência espectral da juventude, transformou esta história de gangster de segunda, num épico de amantes de primeira.

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  6. Não conhecia ainda Nicholas Ray e por isso para mim foi uma novidade.
    Gostei bastante do filme, apesar de não ter gostado do fim (apesar de ser extremamente previsivel).
    Gostei da "inocência" de Bowie - é o mais inocente do gang - e o amor verdadeiro que nasce entre ele e Kitchee.
    Gostei bastante!

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  7. Eu gostei do fim muito pelos olhares finais entre as duas personagens que me fazem crer neles. No seu amor e na sua inocência. E é impossível não ficar comovido com a cena :)

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  8. Quando digo não gostar do fim, é por ter acabado mal - sou uma eterna romântica :S
    Não quis dizer que o fim estava mal feito LOOOOOOL e é como tu dizes, é impossivel não ficar comovido com a cena :'(

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