terça-feira, 14 de agosto de 2012

Tertúlia de Cinema XV: Ficção-Científica

Desde cedo que a ficção-científica faz parte do imaginário do Homem… desde cedo, muito cedo, que o cinematógrafo foi a grande invenção para o imaginário do Homem concretizar ou materializar de forma mais concreta (falemos das imagens que sempre foram a grande falha que a literatura oferecia, o que para muita gente não é falha pois deixa essa vertente no imaginário do homem) esse fascínio pela ficção-científica, pelo desconhecido e pela fuga à realidade com o futuro em mente, o choque do futuro que, mais que qualquer “inclinação” para a vida alienígena que possa ter surgido no cinema, sempre se direcionou para o advento tecnológico e sobretudo para o eterno conflito entre Homem/Máquina. No entanto, a coisa é mais complexa, e na verdade um filme que se restrinja somente à vertente da ficção é muito provavelmente uma nulidade. Na sua génese, a ficção-científica lida com os medos, com o fascínio, os desejos e a procura do homem em relação ao tempo e ao espaço futuros. As escolhas para este tema foram:

- “Metropolis” do Fritz Lang, é aquele que muito provavelmente terá sido o primeiro grande filme de ficção-científica (não nos esqueçamos, ainda assim, do “Le voyage dans la lune” do Méliès);

- “Solyaris” do Tarkovsky que recorre à fé e à procura interior no futuro e num planeta diferente;

- “Fahrenheit 451” do Truffaut que lida com a aniquilação da literatura num futuro próximo e totalitarista como uma alusão ao alienamento causado pelas novas tecnologias.




1º Metropolis (1927)



Realizador: Fritz Lang
Ficha técnica do imdb.




2º Solyaris (1972)



Realizador: Andrey Tarkovskiy
Ficha técnica no imdb.






3º Fahrenheit 451 (1966)



Realizador: François Truffaut
Ficha técnica no imdb.




Tertúlia planeada por Álvaro Martins (Preto e Branco)

Tiny Furniture (2010)

Antes de se ter tornado num fenómeno da Internet depois do sucesso astronónico da série da HBO “Girls”, que ao fim de apenas para uma temporada se tornou numa série de culto e numa referência da feminilidade no século XXI, Lena Dunham já tinha, aos 24 anos, escrito e realizado o seu primeiro filme “Tiny Furniture”. Não se limitando a escrever e realizá-lo, assumiu ainda a responsabilidade de dirigir a própria mãe e irmã (comum em filmes mumblecore), arrancando interpretações incrivelmente honestas de actores amadores e/ou inexperientes num filme que acerta em cheio na representação da loucura pós-Universidade que são os early-twenties.

Como actriz, Dunham faz de Aura um veículo completamente identificativo para quem quer que já tenha tentado fazer algo na vida. Ela anda às voltas na casa dos pais e é óbvio que está a tentar descobrir quando, exactamente, é que o conceito de “casa” se perdeu para ela. A mãe e irmã continuam lá, mas o conforto e calor associado ao regresso a casa perdeu-se. Aura não pertence à vida académica, mas a que conhecia antes também já não a aceita e é no acto de procurar aonde pertence que espera encontrar-se a si próprio, passo o cliché. Dunham é incrivelmente livre de vaidade, interpretando Aura como uma pessoa de carne e osso que pode ser fantástica ou terrível e tudo o que separa um do outro. E esta falta de vaidade é também notável no seu à vontade com pouca roupa no corpo – não por ter o aspecto de uma super-modelo (que não tem) – mas por uma necessidade categoricamente não-sexual de ser vista. Todas estas características, diga-se, aplicam-se também a “Girls”, tornando-se óbvio que o trabalho de Dunham é essencialmente autobiográfico.


“Tiny Furniture” não tenta retratar Aura e o mundo que habita de forma “ficcional”. Apesar de as personagens dizerem praticamente tudo o que lhes vai na cabeça (o que também não é propriamente realista), a vida pelos olhos de Dunham é desarrumada e real. O sexo não é um acto perfeitamente coreografado e que passa de duas pessoas a beijarem-se para duas pessoas abraçadas pós-coito, é desajeitado e trapalhão; as famílias não são sempre compreensivas e cheias de amor incondicional; as pessoas podem ser nefastas. É tudo isso que faz deste filme algo tão sincero, mas principalmente os diálogos de Dunham, que, eximiamente pensados e por vezes brutais, permitem ao filme analisar temas difíceis de forma menos séria. O que podia perfeitamente ser um filme repleto de desespero e depressão é um filme bastante divertido – de forma inteligente e peculiar.

Filmes sobre a vida pós-Universidade abundam, mas nem todos têm o trunfo de ser um projecto de alguém que passou, de uma forma ou outra, por tudo o que está a filmar. “Tiny Furniture” é um olhar franco e por vezes hilariante da forma mais seca imaginável àqueles anos situados entre os estudos e a “vida real”. Lena Dunham criou, como em “Girls”, um mundo cheio de personagens que podiam perfeitamente ser nossos amigos. E essa podia perfeitamente ser a definição na Wikipedia do mumblecore.

segunda-feira, 23 de julho de 2012

In Search of a Midnight Kiss (2007)


Saído da escola de Austin, Texas e devendo muito a “Annie Hall”, “In Search of a Midnight Kiss” é uma criatura totalmente diferente dentro do contexto do mumblecore. Este pequeno e lindíssimo filme não é tão real e verosímil quanto se poderia esperar, valendo principalmente pela qualidade técnica e pelas referências à cultura pop que consegue inserir em 90 minutos de filme. Continua, isso sim, a ser um filme sobre pessoas, pessoas comuns que poderiam ser eu ou tu.

No papel-tipo que nos anos 70 pertenceria a Woody Allen está um protótipo muito característico do século XXI: Wilson (Scoot McNairy) é aquele tipo sensível e romântico, poster-boy da geração-Y, neurótico que ouve música deprimente e se considera misantropo. Numa véspera de Ano Novo estranha, coloca um anúncio no Craigslist, dá uso ao seu bongo e submete-se a uma série de humilhações saídas de um filme dos irmãos Farrely envolvendo discutir os implantes mamários da mãe e ser apanhado, digamos, com as calças pelos joelhos, a olhar para pornografia falseada com a cara da namorada do colega de quarto.

A primeira resposta ao anúncio é, claro, de Vivian, o tipo de rapariga bonita, excêntrica e confiante que acaba invariavelmente por se interessar por este protótipo (mesmo quando se trata de um gajo pálido e nada atraente – como no filme anterior, pensem em “Garden State” ou “Juno”). Sem grandes surpresas, e apesar de isto não ser uma comédia romântica, não se dão bem ao início (o argumento de Alex Holdridge não prima pela originalidade), mas, mais uma vez sem surpresas, acabam por gostar um do outro por meio de uma série de diálogos bem-escritos. Talvez. Já vimos, obviamente, tudo isto noutros filmes, mas é o tipo de situação que não nos importamos de ver mais uma vez. Especialmente quando está a acontecer a personagens de quem gostamos genuinamente.


As dinâmicas relacionais do argumento de Holdridge soam a verdadeiras, especialmente atendendo à época em que vivemos, em que a interacção virtual substituiu quase por completo o “bar”, a pornografia se tornou num tópico de conversa casual e algo como a “infelidade pela Internet” é um potencial entrave a uma relação. Mas mais interessante que a história em si é, sem dúvida, a fotografia de Robert Murphy; o filme serve como um tour maravilhoso e a preto-e-branco da Los Angeles hipster dos nossos tempos, brindando-nos com quase tantos planos da arquitectura da cidade (sem turistas) como das personagens. E é verdadeiramente um prazer ser guiado por uma cidade sobre a qual sabemos, incrivelmente, quase nada, à excepção de que tem uma placa onde se lê “Hollywood”. Quando ultrapassamos o cliché que é, na realidade, o molde do boy-meets-girl, é refrescante ver um tributo despretensioso e com estilo a L.A. da parte dos que se classificam como “indie”, bem como um olhar interessante e reflectido sobre a interacção social num mundo pós-“You’ve Got Mail”.

Pedro Ponte (Ante-Cinema)

quinta-feira, 12 de julho de 2012

The Puffy Chair (2005)


Primeiro filme dos irmãos Duplass e, talvez por isso mesmo, o mais exemplificativo do mumblecore enquanto movimento, “The Puffy Chair” foi a primeira tentativa a sério de Jay e Mark em fazer um filme per say, não surpreendendo, portanto, o facto de se tratar de algo por vezes tão amador e em bruto, amadorismo esse que começaria a reduzir-se nos seus filmes seguintes, em especial “Cyrus” e “Jeff, Who Lives at Home”.

À primeira vista apenas mais uma comédia/drama “indie”, recebida de braços abertos em Sundance, o filme é permeado por uma sensação quase incomodativa de honestidade no que às relações diz respeito, com personagens absurdamente reais. Não obstante todas as suas falhas, este primeiro filme é um exemplo perfeito da força das interpretações, não apenas de Mark mas também dos outros dois actores que o acompanham. Por vezes ignorantes quanto à presença da câmara, os actores são, como em qualquer filme mumblecore, 90% do filme, criando personagens que, mesmo por vezes esterotipadas (o artista, o slacker, etc.), nos soam sempre reais e lembram alguém que certamente conhecemos.

Ao contrário dos tais filmes “indie” que fundem comédia e drama e tão populares se tornaram no início da década passada (pensem em “Garden State”), em que uma personagem, obviamente masculina, conhecia outra, obviamente feminina, que o fazia, miraculosamente, descobrir o sentido da vida, “The Puffy Chair” não vai à procura de sequências perfeitas, momentos transcendentes ou tentativas de humor absurdista. Pelo contrário, mantém-se sempre em território afável e sincero. Há, isso sim, uma quantidade exagerada de indie rock, e no que à música diz respeito o filme aproxima-se, de facto, do de Zach Braff, mas pormenores como a câmara em mão, sequências cruas e iluminação natural afastam-no da estilização e ajudam a criar a ilusão de “autenticidade”.


O filme nunca quebra propriamente nenhuma barreira em relação a “comédias” com foco no romance (não confundir com “comédia romântica”), mas a forma como nos faz identificar com as suas personagens é distinta. Quando o Josh de Mark Duplass segura uma boom box à janela da namorada Emily, percebemos facilmente a piada. E o filme pede-nos que pensemos nos romances cinematográficos com os quais crescemos e, inevitavelmente, comparamos os nossos. Se com Cameron Crowe foi Peter Gabriel a cantar “In Your Eyes”, com os Duplass são os Death Cab for Cutie com “Transatlanticism”, um contraste subtil já que se o primeiro ondulava, os segundos procuram; “I need you so much closer” não é um pedido de intimidade, é o reconhecimento de uma lacuna emocional. E esse reconhecimento é tudo o que Josh lhe pode dar, ouça o que ouvir.

Por mais que gostemos de ver Josh e Emily felizes, os seus problemas manifestam-se em mútuos ataques dolorosos e passivo-agressivos. O pai de Josh aconselha-o que ele sabe tudo o que alguma vez saberá sobre Emily, e que tem que tomar uma decisão baseada no que sabe e não esperar que alguma coisa muito boa ou muito má aconteça. Este conselho, oferecido pelo pai verdadeiro dos Duplass num alpendre pitoresco e tipicamente americano, encoraja-nos a fazer o mesmo em relação ao filme e a nós próprios.


Pedro Ponte (Ante-Cinema)

sábado, 7 de julho de 2012

O Mumblecore Americano

Movimento não-oficial e produto do século XXI por excelência, o mumblecore nasceu um pouco como consequência natural das facilidades e vantagens que o digital trouxe ao cinema. Um pequeno grupo de pessoas, todos eles americanos, que haviam claramente crescido com os filmes de Richard Linklater e Noah Baumbach, que por sua vez se haviam inspirado em John Cassavetes, Bergman, Godard e na Nouvelle Vague em geral, aperceberam-se, pela primeira vez (e alguns anos depois de Blair Witch Project), que não precisavam de dinheiro para fazer um filme. Bastava-lhes uma câmara digital e amigos/familiares para compor o elenco, e as histórias que queriam contar podiam ser filmadas. Este grupo, que rapidamente se tornou num colectivo, incluia Andrew Bujalski, (cujo primeiro filme, "Funny Ha Ha" (2002), é considerado o primeiro filme mumblecore), Mark & Jay Duplass, Aaron Katz, Lynn Shelton, Ben & Joshua Safdie, Joe Swanberg, Greta Gerwig e outros que surgiriam nos anos seguintes, tinham algo em comum: queriam, todos eles, fazer filmes sobre pessoas. Filmes em que o diálogo – escrito ou improvisado – comandasse, em que tudo fosse natural.

O interesse principal do mumblecore não é necessariamente a qualidade cinematográfica. Nenhum destes filmes será lembrado por qualquer tipo de primor técnico ou de outra ordem; pelo contrário, o interesse surge do facto de serem, sem excepção, filmes cujo foco principal são interacções entre pessoas, muitas vezes em situações desconfortáveis e difíceis com as quais é muito fácil, quase automático nos identificarmos. São filmes individuais, exercícios nauseantes em egocentrismo, por vezes, que seriam garantidamente melhores, como obras, se fossem escritas, realizadas e interpretadas por “profissionais”. Não o são e grande parte do seu charme vem, talvez, daí; são filmes imperfeitos, tentativas mais ou menos conseguidas por parte de miúdos que queriam imitar os seus ídolos. Amador mas honesto. Agora que entramos na segunda metade do século, alguns destes miúdos, já mais ou menos crescidos, começam a conseguir uma projecção internacional que vai para além dos círculos underground de Sundance e SXSW (South by Southwest).
Começam a fazer filmes menos improvisados, menos “underground”, em que o orçamento já não é tão inexistente ao ponto de conseguirem pagar a actores, mantendo a qualidade observadora, capaz de momentos de profundidade e compreensão institiva quase acidentais, que só tem origem na inocência e ingenuidade da juventude.

A representar todo este movimento estão, indiscutivelmente, os irmãos Duplass, exímios a contornar a linha entre o independente e o mainstream, cujo mais recente filme "Jeff, Who Lives at Home" prepara-se para lhes oferecer, ou não, o derradeiro passo em direcção ao estatuto de cineastas. De uma geração diferente, produto de outra época mas em situação idêntica está Lena Dunham, escritora, realizadora e protagonista da nova série da HBO “Girls”, que se tornou, quase de imediato, num sucesso e fenómeno de popularidade tão grande e inexplicável precisamente por englobar tantas características do mumblecore. O mesmo acontecerá, certamente, com outros membros deste grupo estranho e co-dependente, em que toda a gente se conhece, em que num dia se é realizador e no seguinte actor ou produtor. E, acima de tudo, numa altura em que toda a gente pode fazer um filme.



Pedro Ponte (Ante-Cinema)

sexta-feira, 6 de julho de 2012

Tertúlia de Cinema XIV: O Mumblecore Americano

1º The Puffy Chair  (2005)


Realizador: irmãos Duplass
Ficha Técnica no imdb






2º In Search of a Midnight Kiss (2007)


Realizador: Alex Holdridge
Ficha Técnica no imdb 





3º Tiny Furniture (2010)



Realizador: Lena Dunham
Ficha Técnica no imdb




Tertúlia Planeada por Pedro Ponte (Ante-Cinema)

segunda-feira, 30 de abril de 2012

Videodrome (1983)



Long Live The New Flesh.
Death to Videodrome


De todos os filmes de Cronemberg, "Videodrome" é talvez o mais surrealista de todos, um surrealismo ligado à tecnologia e por conseguinte um filme de ficção científica,  contudo, com essa tal aura surrealista bem vincada. Claro que a tecnologia no cinema de Cronemberg é muito particular, estamos a falar de algo maquinal, que normalmente é retratado como frio e metálico, algo racional. Se olharmos para "Videodrome" vemos que a tecnologia em Cronemberg é precisamente o oposto, algo quente e carnal, algo mais emocional. Estas características ainda são mais acentuadas no, futuro, "ExistenZ". Claro que "Naked Lunch" também é das obras mais surreais do realizador, mas aqui entra também a adaptação da obra de Burroughs.

De todos os filmes escolhidos este é o que tem o protagonista mais marcante e, verdade seja dita, deve-se ao carismático James Woods que torna o seu Max Renn numa das personagens mais fascinantes de todos os filmes do realizador. Renn é um presidente de uma estação televisiva, o canal 83 da Cabo, e que está sempre na vanguarda dos programas sensacionalistas e chocantes. Quando descobre, através de um sinal pirata, o programa "Videodrome" fica completamente fascinado com a gratificação da violência nele incluído. Estamos a falar de um programa sem enredo e praticamente sem meios de produção, com apenas violência no seu estado mais puro e simplista. A partir daqui envereda numa procura obsessiva por "Videodrome", mas será mesmo este produto um programa de TV? Ou pior ainda, algo real?


Percebe-se pelo parágrafo acima que "Videodrome" é uma forte crítica ao papel que a TV tem assumido nas nossas vidas e que apesar de datar de 83 continua a fazer total sentido e com o mesmo impacto (ou mais até) nos dias de hoje. Mas como escreveu João Palhares aqui, "Videodrome" ainda é mais do que isto.

Max não é o típico herói, se é que é herói de todo, temos aqui um produtor televisivo sedento por sangue, sedento pelo choque. E isso é claro nos programas que procura e no seu discurso quando é entrevistado. É nesse programa que conhece Nicki Brand, interpretada pela mítica vocalista dos Blondie, Deborah Harry. A partir daqui os dois envolvem-se e é em casa de Max que esta acaba por conhecer o famoso "Videodrome". Também ela se envolve no seu fascínio ainda que por razões diferentes. Max quer , qual Messias, revelá-lo ao mundo, ser o seu divulgador, mas, Nicky, quer vivê-lo. As suas paixões são intensas e violentas e a sua cena de sexo com Max são prova disso, naquela que é uma das melhores cenas de sexo jamais filmadas pelo realizador.

Em jeito de conclusão e como já deu para perceber "Videodrome" é quanto a mim uma das obras maiores de Cronemberg, um dos pontos máximos na sua carreira e o meu favorito dos filmes que escolhi. Espero que gostem.



Gabriel Martins (Alternative Prison)

segunda-feira, 23 de abril de 2012

Scanners (1981)


Estava eu a planear esta tertúlia, debruçando-me sobre David Cronemberg, quando acabo por optar pelas palavras "Terror Venéreo" em relação ao tema. Grave erro, "Scanners" de terror venéreo não tem nada, aliás no texto informativo ao tema eu saliento que abordo o terror venéreo e corporal na filmografia do realizador, afinal de contas estão ligados. Mas, porque razão então quando escrevi o título, não coloquei os dois nomes novamente juntos, ou então, só "terror corporal" que engloba tudo? Não sei, talvez porque venéreo atrai mais a atenção, tem mais pinta, enfim, de qualquer das maneiras já está corrigido.

"Scanners" é hoje em dia um dos filmes de maior culto de Cronemberg, tendo vencido o prémio de melhor filme de fantasia internacional na edição do Fantasporto de 1983. A história gira à volta de um grupo de pessoas que é apelidado de Scanners, que se tratam de indivíduos com grandes capacidades telepáticas e telecinéticas. Se perguntarem a qualquer fã deste realizador, para imaginarem uma cena de um dos seus filmes, acredito que a maioria se vá lembrar imediatamente da mítica cabeça a explodir neste "Scanners". Não é que este seja o melhor filme do realizador, para mim não é, mas essa cena é sem dúvida alguma uma das mais marcantes na carreira de David Cronemberg e isso penso ser inegável.

Foi dos filmes mais complicados de realizar, na altura Cronemberg foi "forçado" a iniciar a rodagem com apenas duas semanas de pré-produção, pior, nem o argumento estava completo ainda. Acredito que se tivesse tido mais tempo, o filme ainda seria melhor. E digo isto até mais do ponto de vista narrativo onde teriam mais tempo para desenvolver melhor a história. Ainda assim dentro de todo o caos que parece ter envolvido a produção do filme, é notável o marco que aqui se construiu. "Scanners" foi até a estreia de "The Fly" o seu filme mais rentável, por exemplo.


Stephen Lack, cuja carreira como actor é bastante curta e tendo-se dedicado com mais sucesso à pintura, é Cameron Vale, o protagonista do filme. Quanto a mim Lack não tem uma grande presença no ecrã sendo sempre ultrapassado pelo seu antagonista, o fabuloso Darryl Revok (Michael Ironside) ou o seu mentor, o atormentado Dr. Paul Ruth (Patrick McGoohan). Ainda assim ninguém esquecerá o seu duelo final contra Revok, mais um dos pontos altos de "Scanners".

Espionagem, terror, ficção científica, western; todos estes géneros se encontram em determinado grau neste filme, que é quanto a mim uma das peças mais obrigatórias a conhecer na filmografia de David Cronemberg.

Além deste, existem mais duas sequelas e dois spin-offs, nenhum deste realizador e nenhum que eu tenha visto, sempre tive a sensação que eram completamente desnecessários e apenas um aproveitamento do fenómeno em volta deste trabalho, um pouco como o que aconteceu com "Psycho" de Hitchcock. Claro que posso estar totalmente equivocado.



Gabriel Martins (Alternative Prison)

segunda-feira, 16 de abril de 2012

Shivers (1975)


Nutro uma afeição especial pelo terror claustrofóbico, onde o mote é: "Não há sítio para onde fugir". A ideia de estarmos em perigo e presos numa qualquer localização é absolutamente aterradora, tal como tudo que mexe com a nossa liberdade. Algumas pérolas do género terão de ser o "Alien" de Ridley Scott, pois "no espaço ninguém te consegue ouvir", e o "The Thing" de John Carpenter situado na gélida e desértica Antárctica onde o "Homem é o sítio mais quente para se esconder". Antes destes em 1975 um jovem realizador Canadiano, até então praticamente desconhecido, escreveu e realizou "Shivers" também conhecido por "They Came from Within,". Aqui o espaço e a Antárctica são substituídos por um local mais familiar, um complexo de prédios situado numa ilha no Canadá, e por sua vez as entranhas rebentadas por dentro dão lugar a uma "orgia de parasitas sanguíneos" (o título pelo qual foi filmado).

É precisamente nestes parasitas que o filme de Cronemberg se distingue entre os do seu género. A início a sua investigação era dirigida para substituírem órgãos, porém, a dada altura o médico que os criou privilegiou outro aspecto do corpo humano, a estimulação da libido, tentando colocar assim o Homem em maior contacto com a sua natureza sexual que é constantemente bloqueada ou escondida em prol de valores culturais e morais. O resultado final é uma epidemia de sexo, pois todos os infectados vagueiam pelos diversos andares a tentar fornicar uns com os outros, infectando por sua vez quem lhes aparecer à frente. No fundo em vez de termos o típico grupo de pessoas a infectarem-se e matarem-se umas às outras, como os Zombies, temos um grupo de pessoas a tentar recriar, à força, as cenas em "Eyes Wide Shut", só que sem o glamour das máscaras de Veneza, até porque o glamour de "Shivers" é outro, é sangue e carne.


Também se acaba por sentir um paralelismo em relação ao tema das doenças sexualmente transmissíveis, mais especificamente em relação a esse terrível parasita que é o vírus do HIV, mas que curiosamente só seria descoberto 6 anos após a estreia de "Shivers".

Na altura o jornalista Robert Fulford arrasou o filme que tinha sido financiado pelo estado, mais especificamente pela Telefilm Canada (como é hoje apelidada). O texto de Fulford ostentava como título "You Should Know How Bad This Movie Is, You Paid For It.". Por causa desta crítica severa o realizador foi expulso do seu apartamento e teve maiores dificuldades em encontrar subsídios para os seus projectos futuros. Contudo, como hoje sabemos, não foi nada que Cronemberg não tivesse superado e prova disso é a sua extraordinária carreira.



Gabriel  Martins (Alternative Prison)

quarta-feira, 4 de abril de 2012

Tertúlia de Cinema XIV: O Terror Venéreo/Corporal em David Cronemberg

Em jeito de antecipação para o mais recente projecto de David Cronemberg, "Cosmopolis", a estrear no final de Maio, optei por recordar os primeiros tempos deste realizador e aqueles que para muitos são os seus "anos de ouro", ou seja, a altura em que explorava como poucos o terror venéreo e/ou corporal. É aqui que nasce o seu fascínio pela carne que se tornaria na sua imagem de marca.

Goste-se mais de um período ou de outro, a verdade é que dificilmente se pode dizer que a carreira de Cronemberg não tenha sido sólida. Mesmo os seus mais recentes projectos de onde destaco "A History of Violence" e "Eastern Promisses" são filmes fortes e com uma realização cuidada. São, ainda que muito diferentes dos filmes aqui apresentados, dois grandes Cronemberg's. Com a curta amostra de "Cosmopolis" veio um sabor ao passado do realizador. Será este um regresso à filmografia pela qual ficou conhecido? É esperar para ver e até lá porque não recordar esse passado?




1º Shivers (1975)


Ficha Técnica no imdb


A ter início em 16 de Abril de 2012



2º Scanners (1981) 



Ficha Técnica no imdb


A ter início em 23 de Abril de 2012





3º Videodrome (1983)



Ficha Técnica no imdb 


A ter início em 30 de Abril de 2012





Tertúlia Planeada por Gabriel Martins (Alternative Prison)

sábado, 31 de março de 2012

Trzecia Czesc Nocy (1971)


Mesmo estando já familiarizado com o cinema de Zulawski quando vi este filme pela primeira vez, fiquei surpreendido com o seu tom ameaçador e severo. Hiperestilizado, http://www.blogger.com/img/blank.gifmas com muitas preocupações debaixo da superfície, Trzecia Czesc Nocy (The Third Part Of The Night) vai para trás e para a frente, dando vida aos pesadelos e aos lados mais obscuros das personagens. É difícil descrever um filme tão denso e desolador. Dualidades, psicologia, morte e ressurreição estão ao virar da esquina e os caminhos crípticos e dementes que Zulawski escolhe para lá chegar são únicos e fascinantes.


David Lourenço (O Narrador Subjectivo)

sexta-feira, 23 de março de 2012

Rysopis (1964)


Skolimowski escreve, realiza e interpreta um filme sobre um jovem sem rumo. Andrzej pondera calmamente o seu futuro, divagando a cidade no espaço de 24 horas. Para onde pode ir, a que se pode agarrar, que tem a prende-lo. A melancolia é cortante e o ingresso no exército, ou seja, deixar tudo para trás, é uma hipótese. Impossível não referir os longos planos-sequência que povoam o filme.

David Lourenço (O Narrador Subjectivo)

terça-feira, 13 de março de 2012

Nóz W Wodzie (1962)


A estreia de Roman Polanski é dos filmes mais singulares que já vi. Um casal, ele bem mais velho que ela, convida um jovem para uma volta de barco. As personagens entretêm-se com querelas mundanas à medida que, distantes da civilização, se libertam de formalidades e se deixam dominar pelos mais básicos instintos humanos. A trama começa a tomar contornos absurdistas e sempre que certos clichés parecem estar prestes a vir à superfície, o argumento afunda-os no lago que o trio navega. Há um sentido de intemporalidade num filme que tem tanto de vitriólico quanto de solidão.



David Lourenço (O Narrador Subjectivo)

sexta-feira, 2 de março de 2012

Tertúlia de Cinema XIII: Cinema Polaco

Polónia... um país com uma História de sofrimento e persistência. Após uma devastadora Segunda Guerra Mundial e sob ditadura comunista, aparece, nos anos 50, o movimento da Escola de Cinema Polaca, liderado por realizadores como Wajda, Munk ou Has, que abriram caminho para uma não-oficial nova onda na década seguinte, com filmes menos políticos e mais metafóricos. Assim surgem Skolimowski, Zulawskhttp://www.blogger.com/img/blank.gifi e o famosíssimo Polanski. É sobre estes que me irei focar nesta tertúlia por mim coordenada, uma tertúlia de cinema algo esquecido, uma tertúlia em homenagem às origens de alguns dos maiores realizadores Europeus, uma tertúlia dedicada a uma nação com uma História que também se faz de muita cultura.



1º Nóz W Wodzie (1962)



Realizador: Roman Polansky
Ficha Técnica no imdb
Trailer

A ter início em 13 de Março de 2012




2º Rysopis (1964)


Realizador: Jerzy Skolimowski
Ficha técnica no imdb
Trailer

A ter início em 23 de Março de 2012





3º Trzecia Czesc Nocy (1971)


Realizador: Andrzej Zulawski
Ficha técnica no imdb
Trailer

A ter início em 31 de Março de 2012




Tertúlia Planeada por David Lourenço (O Narrador Subjectivo)

terça-feira, 28 de fevereiro de 2012

Santa Sangre (1989)


É o meu preferido. É de 1989 e consegue passar uma premissa, mesmo que seja hiperbolizada, muito real e consegue também surpreender com um twist fenomenal, distante do cliché hollywoodesco.

As personagens, actores, história, cor, emoções e género fazem com que seja difícil ficar indiferente a este filme. O surrealismo contínua iminente ao longo do filme, brincando com o estilo gore, de um modo clássico e quase solene, lembrando o terror apenas presente em filmes americanos como "Shining", talvez seja o mais próximo, mesmo que muito difícil de se comparar.


Andreia Mandim (Cinema's Challenge)

sábado, 18 de fevereiro de 2012

The Holy Mountain (1973)

"The Holy Mountain" data de 1973, altura em que Jodorowsky incidiu no esoterismo dos westerns, moldando-o e explorando-o de forma surrealista. No entanto, não chegou a ter uma distribuição digna, acabando anos depois por se consagrar entre os circuitos de cinema mais alternativos e desconhecidos.


Andreia Mandim (Cinema's Challenge)

sexta-feira, 10 de fevereiro de 2012

El Topo (1970)


El Topo, de 1970, é o seu primeiro filme e o chamado “acid western”, um subgénero nascido do western entre os anos 60 e 70. Tornou-se mais tarde, à semelhança do "The Holy Mountain" um filme de culto nos circuitos menos comerciais, ou, digamos mesmo, “escondidos” do público comercial.


“El Topo" não é um filme western, ele vai mais além do que todos os westerns; "El Topo" não é um filme religioso, ele contém todas as religiões; é um filme místico; é sangue; é sexual; é miraculoso e terrível; é divertido; é violento; é monstruoso e cruel; é mais que espectacular, é uma experiência para toda a vida….



Andreia Mandim (Cinema's Challenge)

quarta-feira, 8 de fevereiro de 2012

Cinema avant-garde


É geralmente o adjectivo usado para definir um movimento artístico que surge de trabalhos experimentais ou inovadores, e, neste caso, particularmente da sétima arte: o cinema.

Alejandro Jodorowsky é uma das caras mais importantes do avant-garde. O multifacetado realizador chileno desde sempre tentou incutir nos seus trabalhos – que vão desde banda desenhada a filmes – a ideia de um mundo diferente, submergido pelo surrealismo, sendo este último diferente do surrealismo presente nos filmes de Lynch ou Cronemberg. Mas, sim, um surrealismo provocador e aclamado de herege, violento, corrosivo, marcado por uma mistura de misticismo com as emoções mais profundas do ser humano – sejam neuroses ou amor.

Os resultados do trabalho de Jodorowsky são um conjunto de filmes absolutamente distintos daquilo que algum dia seria sequer imaginável ver num produto americano. Passa pela estranheza, quase repulsa, mas comove e fascina ao mesmo tempo. Sangue, muito sangue e imagens perturbadores e chocantes, sexo, violência e sentimentos, tudo num só filme ou conjunto de obras deste autor.

Alguns dos exemplos são assim propostos na minha lista para este mês.


Andreia Mandim (Cinema's Challenge)

quarta-feira, 1 de fevereiro de 2012

1º aniversário


O 1º post, o de apresentação, data do final de Janeiro, mas a primeira "Tertúlia" foi a de Fevereiro sob o manto do Filme Noir.

Agora voltando a Fevereiro completou-se um ano, um ciclo. Algumas coisas mudaram, mas coisa pouca. Mantém-se uma programação interessante, diversificada e equilibrada todos os meses. A todos os que perderam tempo para ajudarem nessa mesma programação, um muito obrigado.

A todos os que passam por cá, espero que de alguma forma o blog tenha sido útil, seja para descobrir ou re-descobrir filmes, para conhecer outras opiniões ou para o que quer que seja.
Porque gostar de cinema é querer conhecer mais, é uma fome que nunca tem fartura.

O assustador é que passou depressa. Foi mesmo há um ano que isto começou?

Tertúlia de Cinema XII

Tema: Cinema avant-garde, com Alejandro Jodorowsky




1º El Topo (1970)




Realizador: Alejandro Jodorowsky
Ficha Técnica no imdb


Trailer:



A ter início em 10 de Fevereiro de 2012




2º The Holy Mountain (1973)





Realizador: Alejandro Jodorowsky
Ficha Técnica no imdb


Trailer:



A ter início em 18 de Fevereiro de 2012




3º Santa Sangre (1989)



Realizador: Alejandro Jodorowsky
Ficha Técnica no imdb


Trailer:



A ter início em 28 de Fevereiro de 2012





Tertúlia planeada por Andreia Mandim (Cinema's Challenge)

sábado, 28 de janeiro de 2012

Dellamorte Dellamore (1994)


Após a minha desistência do curso de Comunicação Social, tive a sorte de viver quatro anos em Boston, no estado de Massachusetts, para onde fui estudar o que realmente queria. O trabalho era árduo, mas eu descobri a minha salvação numa secção de DVD´s da Tower Records chamada Midnight Movies - nesta secção, descobri todos os clássicos da série B (ou série C!). Filmes eróticos do Ed Wood, lésbicas na prisão, o catálogo da Troma. Foi aqui também que descobri a minha paixão por filmes de zombies e pelo terror italiano: Fulci, Bava, Argento. Entre estes filmes descobri um filme chamado Cemetery Man, originalmente Dellamorte Dellamore, e é uma adaptação livre de um famoso fumetti italiano chamado Dylan Dog. Quando vi a capa, claramente camp, pensei que seria "mais um". Mais um entre outras centenas de filmes de zombies, daqueles que rapidamente desaparecem da memória. Não é. É um filme especial: é um filme muito especial.


Não há milagres - Michele Soavi fora assistente de realização do supra-citado Terry Gilliam no maravilhoso filme The Adventures of Baron Munchausen (1988), outro filme incompreendido de Gilliam, que foi um verdadeiro desastre de bilheteira.

A realização de Dellamorte Dellamore mostra uma sensibilidade especial - é um tratado sobre o amor, sobre a amizade, sobre a traição, sobre a morte. As influências do realizador são várias - vemos o surrealismo de Gilliam, vemos os mestres do novo cinema de terror italiano, vemos a composição de René Magritte (de realçar a sequência baseada no quadro Os Amantes). Sim. Este filme não é um cachimbo. É bem mais do que isso - embora disfarçado de um filme de zombies, este filme é, sem dúvida alguma, um poema visual e um testemunho profundo sobre importantes questões existenciais.


"This film was not a horror film. This film was about the fear of life."

Michele Soavi - 2010 interview



Infelizmente, pouco mais se ouviu falar deste brilhante realizador. Retirou-se pouco após este filme para tratar do seu filho, que viria a falecer de uma doença crónica. Embora tenha recentemente retomado a sua carreira de realizador, vi, neste seu filme, algo que não se encontra com frequência: verdadeira generalidade.

Para concluir, digo que este filme serviu de motivação para fazer uma interrupção na minha vida de músico e abraçar um projecto cinematográfico - a minha primeira curta-metragem, "I´ll see you in my dreams", foi uma homenagem directa a este filme. O facto de o título ser uma canção tem directamente a ver com Brazil, em que uma canção sumariza a ideia principal do filme.


Filipe Melo (Dog Mendonça e Pizzaboy)

quinta-feira, 19 de janeiro de 2012

Dreams (1990)


Lembro-me de onde e quando vi este filme pela primeira vez. Em Lisboa existe um Centro Comercial que tinha um cinema, o Apolo 70. Vi-o aí, na companhia da minha mãe, numa das inúmeras vezes em que nos metíamos num cinema sem saber o que nos esperava. Sem querer estar armado em esperto, creio que ainda hoje acho que este não é filme para um pré-adolescente, mas aconteceu, e ainda bem que aconteceu, porque o adorei desde o primeiro dia; e o único filme japonês que até então conhecia era o Godzilla.

Este filme é baseado nos próprios sonhos de Akira Kurosawa, e é dividido em vários capítulos ou segmentos independentes. O que me surpreende é a forma como um filme muito mais visual do que narrativo conseguiu permanecer durante tantos anos na minha memória - e eu tinha uma mente pouco adulta, habituada ao História Interminável, ao Conan o Bárbaro e aos filmes do Van Damme. Ainda hoje me pergunto como é que este filme conseguiu, de facto, marcar-me da forma como marcou. Este filme é, de alguma forma, uma espécie de biografia do inconsciente do seu realizador.


Como nos filmes acima referidos, é muito difícil falar sobre um objecto artístico que se baseia fortemente na abstracção - a memória torna-se sensorial e emocional, e qualquer discussão sobre os aspectos técnicos ou narrativos torna-se completamente secundária e irrelevante.

O que une estas três obras é essa abstracção: a fusão entre o fascinante mundo dos sonhos e o cinzento mundo real. Motivam-nos a misturá-los cada vez mais nas nossas próprias vidas, e a não esquecermos aquilo que sempre fomos, desde as mais remotas memórias que temos até àquilo que somos hoje, enquanto adultos.


Filipe Melo (Dog Mendonça e Pizzaboy)

terça-feira, 10 de janeiro de 2012

Brazil (1985)


Vi este filme pela primeira vez no princípio dos anos 90, sem saber quem era o Terry Gilliam, apesar de, pelas noites da RTP, conhecer bem os Monty Python. Aluguei-o, como a muitos outros, no videoclube do Centro Comercial Fonte Nova, especialmente por duas razões: a primeira foi o Robert de Niro, que na altura tinha pelos cinemas um filme de que gosto muito chamado Midnight Run (1988). A segunda razão foi o Bob Hoskins, de quem eu era fã por causa do Who Framed Roger Rabbit?, filme do mesmo ano.


Nada me poderia preparar para a experiência que se seguiu. Eu estava à espera de um filme normal. O que se seguiu foi, no entanto, uma experiência muito especial. Brazil é um filme que consegue algo verdadeiramente difícil - conciliar um orçamento gigante com uma história surrealista, pessoal e extremamente perturbadora. O final deste filme(acompanhado pela alegre canção de Ary Barroso - Aguarela do Brasil) continua a ser, a meu ver, um dos momentos mais desesperantes e aterrorizadores da história do Cinema. Porém, existe um contraste muito grande entre o mundo horrível em que o protagonista vive e o mundo imaginário que o liberta da realidade controladora e burocrática do seu dia-a-dia. À medida que o filme avança, o mundo de sonhos de Sam Lowry (Jonathan Pryce) vai-se misturando com o mundo cinzento que o cerca, gerando uma espiral em que nós, como meros espectadores, nos vamos envolvendo e da qual não sairemos durante muito tempo - literalmente enlouquecemos com a personagem.


"I actually design [a film] so that, I hope, people will go back and see it again and again. I find that most films are a little bit like fast food. I mean you have them and it's fine and it's over and done with and that's the end of it. And I like the idea of going back and rediscovering, or discovering new things all the time."


- Gilliam, 1986 Interview



A narrativa do filme é relativamente linear, porém, a forma como é contada faz com que seja um filme extremamente original. Não irei contar-vos a história - é um filme que terão de ver, porque não há qualquer forma de utilizar palavras para o descrever. Este filme é, possivelmente, o melhor exemplo da mente visionária de Terry Gilliam, que continua a ser um dos poucos realizadores que consegue evitar cedências face à pressão dos grandes estúdios, o que também explica os gigantes problemas de produção que caracterizam todos os seus filmes. A complexidade de Brazil faz com que não seja só um filme. É uma viagem à imaginação e aos próprios sonhos do realizador.


Filipe Melo (Dog Mendonça e Pizzaboy)

segunda-feira, 2 de janeiro de 2012

Tertúlia de Cinema XI

Tema: Os Sonhos no Cinema



É sempre muito complicado para mim escrever sobre filmes, música (ou qualquer arte), especialmente se tentar escrever um texto mais emocional que técnico. Para esta tertúlia, decidi enfrentar o desafio de contrariar a minha tendência natural para preparar tudo e decidi apenas escrever, sem revisão, sem preocupações e, acima de tudo, sem pretensões. São filmes de que gostei muito e com os quais tenho uma relação emotiva muito forte. Acredito que, de uma forma pouco óbvia, estão intimamente relacionados.




1º Brazil (1985)



Realizador: Terry Gilliam
Ficha Técnica no imdb


Trailer:



A ter início em 10 de Janeiro de 2012








2º Dreams (1990)



Realizador: Akira Kurosawa
Ficha Técnica no imdb


Trailer:


ver aqui.


A ter início em 19 de Janeiro de 2012







3º Dellamorte Dellamore (1994)





Realizador: Michele Soavi
Ficha Técnica no imdb



Trailer:



A ter início em 28 de Janeiro de 2012





Tertúlia planeada por Filipe Melo (Dog Mendonça e Pizzaboy)